segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Um auxílio poderoso

Por Natalino Salgado Filho
Natalino Salgado: ” A dedicação de um dia aos doentes é uma convocação à lembrança daqueles que sofrem e mais que isso, é uma convocação ao ato de cuidado”
No próximo dia 11, a Igreja Católica celebrará, oficialmente, o dia do doente. Instituído pelo Papa João Paulo II, a data serve para nos lembrarmos daqueles nossos irmãos que sofrem de males que lhes causam dores e sofrimentos, seja de qual ordem for.
A despeito do grande avanço da Medicina, pesquisas científicas têm constatado que a oração e a meditação são aliados importantíssimos para a cura. Uma dessas provas é o trabalho do professor Andrew Newberg, da Universidade Thomas Jefferson. Ele selecionou idosos que relatavam problemas de memória e os estimulou a desenvolver a prática de orar e meditar. Durante 8 semanas, por 12 minutos diários, o médico observou o grupo e relatou consideráveis melhoras após esse período.
De fato, desde os anos 1970 que a academia vem explorando a interface entre adoecimento e religião. A Revista de Psiquiatria da USP, em 2007, dedicou um número inteiro sob o tema Espiritualidade e Saúde Mental. Recentemente, o Fisiatra Marcelo Saad (2001) escreveu um artigo intitulado Espiritualidade Baseada em Evidências, termo consagrado, mas para as práticas médicas. Nesse trabalho ele afirma: “Espiritualidade pode ser definida como um sistema de crenças que enfoca elementos intangíveis, que transmite vitalidade e significado a eventos da vida. Tal crença pode mobilizar energias e iniciativas extremamente positivas, com potencial ilimitado para melhorar a qualidade de vida da pessoa.”
Em 2012, a editora L&PM publicou o livro Medicina, Religião e Saúde de autoria de um dos maiores especialistas nesta área, dr. Harold Koenig, da Universidade Duke,Carolina do Norte, EUA. O livro destaca dezenas de pesquisas com evidências diretas do benefício da prática religiosa durante o processo de adoecimento.
O que é interessante nessas pesquisas não é somente o interesse genuíno, mas descobrir aquilo que o homem e a mulher simples sabiam e sabem de forma intuitiva e experiencial. As agruras da vida, entre elas a doença, podem e devem ser enfrentadas com a prática da oração, por exemplo. Não é que se esteja relegando o conhecimento científico e substituindo-o por rituais religiosos: trata-se de reconhecer que o sistema imunológico, por exemplo, é fortalecido, quando as pessoas se harmonizam e ganham resiliência ao enfrentar um tratamento exaustivo como uma quimioterapia.
A prática cristã sempre esteve profundamente associada ao cuidado dos desvalidos. Os primeiros hospitais, na Europa, foram iniciativas de religiosos, numa época em que, no máximo, só poderia ser dado ao doente o conforto de uma cama e nada mais. A motivação do cuidado é inspirada nas palavras de Jesus proferidas no Evangelho: “Pois eu estava com fome, e vocês me deram de comer; eu estava com sede, e me deram de beber; eu era estrangeiro, e me receberam em sua casa; eu estava sem roupa, e me vestiram; eu estava doente, e cuidaram de mim; eu estava na prisão, e vocês foram me visitar.” (Ev. São Mateus 25.35,36)
Rubem Alves escreveu um texto chamado “A doença”, no qual ele diz, de forma poética, que todas as coisas belas do mundo são filhas da doença. Sabiamente, o escritor nos alerta que a doença é a possibilidade da perda, emissária da morte. “Sob seu toque, tudo fica fluido, evanescente, efêmero (…) a saúde emburrece os sentidos. A doença faz os sentidos ressuscitarem. Então não brigue com sua doença. Trate de aprender o que ela quer lhe ensinar. Ela quer ressuscitar seus sentidos adormecidos”.
É uma delicada perspectiva para encarar nossas dores e as alheias. A dedicação de um dia aos doentes é uma convocação à lembrança daqueles que sofrem e mais que isso, é uma convocação ao ato de cuidado. As pesquisas, às quais nos referimos, destacam que o bem não está apenas em que a própria pessoa pratique certo ritual religioso, mas que faça com outros ou que seja alvo da intenção de uma oração. De algum modo misterioso, somos capazes de nos conectar uns com os outros de tal forma, que isto influencie a condição de bem-estar. O Papa Francisco foi muito feliz como provedor dessa iniciativa. Que seja para nós um desafio para vivermos plenamente a espiritualidade cristã.
*Professor Titular de Medicina da UFMA, Chefe do Serviço de Nefrologia do Hospital Universitário da UFMA, Coordenador da Pesquisa Clinica em Nefrologia do HUUFMA, Coordenador da Liga de Afecções Renais do HUUFMA

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