“ Ó velho Deus dos homens 
eu quero ser tambor. 
E nem rio 
e nem flor 
e nem zagaia por enquanto 
e nem mesmo poesia. 
Só tambor ecoando a canção da força e da vida 
só tambor noite e dia 
dia e noite tambor 
até à consumação da grande festa do batuque! 
Oh, velho Deus dos homens 
deixa-me ser tambor 
só tambor! ” 
(Trecho do poema “Quero ser tambor” do moçambicano José Craveirinhas ) 
             Não era seu amigo, seu colega, seu vizinho, não conheço sua família e nem mesmo a conhecia pessoalmente, apenas trocávamos cumprimentos quando nos víamos. A única coisa que nos unia era o encanto provocado pelo som dos tambores que desde criança, por influência  do meu bom e saudoso pai, aprendi a gostar e valorizar. Não sou um frequentador assíduo das festas de tambor de crioula, mas sempre que posso  acompanho as apresentações e participo timidamente com as palmas da mão, principalmente na Praia Grande onde encontro amigos e amigas que compactuam  o mesmo prazer. Em quase todas às vezes, ela estava ali, naquelas ruas de pedra e casarões antigos, com seu corpo magro e aparentemente frágil, vestida com uma saia longa e florida,  deixando a plateia admirada e de certa forma hipnotizada com seu bailado suave e ligeiro  e  ao mesmo tempo contagiante, à frente dos tambores batidos por negros de mãos calejadas pela labuta diária e motivadas por generosas doses de cachaça. Um verdadeiro espetáculo da nossa cultura popular. 
             Naquela manhã de sábado, sábado de aleluia, dia 26 de março, acordei e liguei meu computador buscando notícias a respeito do nosso tão conturbado momento político e me deparei com a  noticia do assassinato de uma professora e bailarina. Olhei sua foto, li e reli a matéria. O choque foi inevitável, em seguida me veio a revolta, a indignação, e por fim, uma profunda tristeza. Não me contive, os olhos lacrimejaram. A imagem dela bailando  não me saiu da mente durante todo aquele dia. Depois de refeito do estranho abatimento - como disse, a gente mal se conhecia -, vieram os questionamentos: Por que alguém  tira a vida do outro por tão pouco ? Por que ela ? Por que não uma pessoa cruel? Acredito que alguém que  tem por vocação ensinar e por diversão  dançar  é  envolto  em uma aura bondosa e colorida e  deveria permanecer entre nós por muito tempo. Certamente, a partir de agora, sempre que estiver em uma roda de tambor lembrarei daquela mulher gingando e rodopiando em uma sincronia perfeita com o batuque dos tambores,  numa alegria indescritível. Sentirei sua falta.                Segundo Einstein, o mundo é um lugar perigoso de se viver, não por causa daqueles que fazem o mal, mas sim por causa daqueles que observam e deixam o mal acontecer. Os tambores de São Luis se calaram por alguns instantes em homenagem , mas não devem se calar jamais, assim como as batidas do coração das pessoas que amam a vida. 
              Que o bom DEUS permita que as batidas do coração da professora e bailarina, associadas ao som dos tambores e das trombetas, ecoem no céu e cheguem até nós anunciando boas novas.  
Que rufem os tambores contra a VIOLÊNCIA ! 
Que rufem os tambores clamando por JUSTIÇA ! 
Que rufem os tambores chamando para  ALEGRIA ! 
Que rufem os tambores a favor da PAZ ! 
Laércio Lúcio  Oliveira 
Professor de Matemática 
* Esse texto é uma singela homenagem a professora e bailarina ANA LÚCIA DUARTE SILVA , uma expoente da alegria, mais uma vítima do nosso mundo tantas vezes cruel e perverso. 

Amei
ResponderExcluirA prematura e violenta morte da professora/bailarina Ana Lúcia nos causa comoção e uma certa revolta. É tempo de reivindicar e cobrar das autoridades (?)competentes que sejam responsabilizados os culpados. Como também melhorias das condições de acesso de nossas estradas, saneamento, saúde, educação... enfim, a lista é extensa.
ResponderExcluirPor outro lado, ficou seu legado: o amor à educação e à nossa arte, que agora desperta nostálgicas recordações a quem lê essa essa crônica (como outrora ao autor, rs).
Faço coro a esse rufar de tambores por uma sociedade justa e digna de se viver!