Natalino Salgado Filho
No artigo
publicado na semana passada, exaltei a memória do médico e humanista Antonio
Jorge Dino que, se vivo estivesse, completaria 100 anos no próximo dia 22 de
maio. Dada a exiguidade do espaço, não foi possível abordar naquele texto um de
seus maiores legados ao povo do Maranhão: a Fundação que leva seu nome e que
administra o Hospital Aldenora Bello, referência para o tratamento de câncer no
Maranhão.
Há quase
cinquenta anos o hospital “Aldenora Bello” - seu nome é uma homenagem à esposa
do então governador Newton Bello, por ter sido a primeira-dama uma das
fundadoras e a primeira presidenta da Rede Feminina de Combate ao Câncer, nos
idos de 1962 - iniciou suas atividades de ofertar serviço de atendimento aos
portadores de câncer no Estado do Maranhão. O início foi bastante humilde, o
que faz lembrar a advertência do profeta bíblico Zacarias de que não se deve
fazer pouco caso dos pequenos começos ou, noutras versões, das coisas pequenas.
Resumia-se o Hospital Aldenora Bello a três cômodos: um consultório, uma sala
de raios X e uma sala para as voluntárias.
Havia
muito a fazer. E foram a visão denodada e a paixão pelo servir ao próximo que
moveram Antonio Jorge Dino e sua incansável esposa Enide Dino - ambos
dirigiram, respectivamente, a Liga Maranhense de Combate ao Câncer e a Rede
Feminina de Combate ao Câncer no Estado - os responsáveis por erguer não apenas
um conjunto de prédios, mas um patrimônio imaterial, consistente em respeito,
cuidado, atenção e tratamento humanizado para milhares de pacientes que foram
(e para aqueles que são e ainda serão) atendidos no Hospital. Tudo isso aliado
à tecnologia dos equipamentos (a história da vinda da bomba de cobalto é
pontuada por diversos episódios que podem ser classificados como quase
milagres) e à expertise de centenas de profissionais e voluntários que trilham
na senda aberta por Antonio Jorge Dino e que a cada dia inscrevem seu nome no
trabalho que desenvolvem, ainda que anonimamente.
Conta-se
que o herói grego Hércules, ao cumprir os três últimos dos 12 trabalhos que lhe
foram ordenados por Eristeu, rei de Argos, finalmente alcançou a imortalidade.
O paralelo entre o herói mítico e o personagem maranhense faz nos pensar que
essa mesma honra já alcançou o nome de Antonio Jorge Dino.
Nos livros
da história do Maranhão, há que ser dedicado um capítulo para contar a saga
empreendida pelo casal Dino que, enfrentando dificuldades de toda a sorte
(financeiras, principalmente) conseguiram fazer com que o Hospital Aldenora
Bello se firmasse como o único hospital maranhense dedicado exclusivamente ao
tratamento das neoplasias. Trata-se de um feito singular.
Quando
Winston Churchill convocava a Inglaterra a resistir e lutar contra as forças
nazistas, ele prometeu apenas suor, sofrimento, sangue e lágrimas. Não creio
que alguém tenha prometido o mesmo ao longo da história do hospital, mas
certamente estas palavras fazem parte do seu legado. Com uma diferença: houve
alegria em cada pequena e grande vitória que explicam sua existência.
Não
bastasse oferecer um espaço de saúde que atendesse à população - que até meados
dos anos setenta não tinha, no Maranhão, onde se tratar de câncer - a Fundação
Antonio Jorge Dino abraçou mais um desafio, pois grande parte dos enfermos, por
ser do interior, enfrentava uma dificuldade extra de não ter onde se hospedar.
Eram pessoas pobres que estavam lançados à sorte da piedade e compaixão dos que
deles se compadecessem. A solução: na década de noventa, a Fundação Antonio
Jorge Dino adquiriu um imóvel e transformou em casa de apoio a essas pessoas.
Em 2000, uma nova casa dedicada a receber crianças, conhecida como Casa de Apoio
Criança Feliz. Ambas são administradas pela Fundação, através do Núcleo de
Voluntárias "Santinha Furtado”.
Mas essa
história ainda não tem um ponto final. O desafio é diário: o INCA (Instituto
Nacional do Câncer), órgão do Ministério da Saúde, em seu relatório “Estimativa
2012 de Incidência de Câncer no Brasil” registra que o Maranhão está em sexto
lugar entre os estados do Nordeste com 6.090 novos casos, considerando todos os
tipos de câncer acompanhados regularmente pelo relatório.
Por
evidente, devem ser contabilizados os casos existentes e que em maior ou menor
grau demandam cuidados regulares pela equipe multidisciplinar do hospital. Um
trabalho árduo é realizado ainda no sentido de manter o nível de qualidade
compatível com as novas tecnologias e procedimentos requeridos nos variados
tipos de neoplasias que somam quase duas dezenas, dentre as mais comuns.
Louvável
ainda o exemplo da nova geração da família Dino, que continua a expandir aquilo
que um dia foi apenas sonho dos precursores da Fundação Antonio Jorge Dino.
Lembro ainda do salmista Davi, que numa de suas mais poéticas passagens,
descreve a esperança e a história de seu povo com estas palavras: “Os que
semeiam com lágrimas, ceifam em meio a canções. Vão andando e chorando ao levar
a semente. Ao regressar, voltam cantando, trazendo seus feixes.” (Salmo 126).
Doutor em
Nefrologia, reitor da UFMA, membro do IHGM, da ACM, AMC e AML
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