Chico Maranhão: “É preciso tirar a roupa, ficar nu”
Papete: “Me decepciono com meus ídolos” O que pensam artistas maranhenses sobre a polêmica das biografias? O que acham da posição tomada por nomes ilustres da MPB como Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil e Djavan, que se juntam a Roberto Carlos e defendem uma autorização prévia e negociada do artista para a publicação de livros biográficos? O tom de alguns, como Chico Maranhão e Papete, é de certo desapontamento. Ambos afirmam que não há o que temer.
O cantor e compositor Chico Maranhão, em texto que me fora encaminhado por ele via email, diz que os artistas são instrumentos de suas obras, ações, comportamentos e pensamentos, tudo isso posto em nome da construção de “uma sociedade melhor”. Fatos registrados numa biografia, segundo ele, dependem da força das palavras lançadas ao longo da história. E as palavras, afirma, têm interpretações diferentes, leituras diversas.
O autor de “Ponto de fuga” não vê razões para receios ou resistências às biografias. “Não há que ter medo”. Papete, cantor, compositor e instrumentista, comunga da mesma ideia. “Quem não deve não teme”, disse ele em post na sua página do Facebook. Segundo Papete, quem leva uma vida digna, decente e honesta não tem com o que se preocupar. “Afinal, o que teriam a esconder da gente?”, questiona.
O tema das biografias não autorizadas está na ordem do dia e virou pauta recorrente nos principais jornais, revistas, blogs e programas de TV do País. A Associação Nacional dos Editores de Livros (Anel) reacendeu a polêmica ao mover ação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra artigos do Código Civil que protegem artistas biografados.
De acordo com o artigo 20 do Código Civil, salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, publicação, exposição ou utilização da imagem de uma pessoa “poderão ser proibidas se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade”, ou se destinadas a fins comerciais.
O grupo Procure Saber, que tem como porta-voz a ex-atriz e produtora cultural Paula Lavigne, levanta a bandeira do direito à privacidade e, subliminarmente, defende interesses comerciais dos biografados. “Se a obra diz respeito à vida e à carreira do artista, é natural que ele (o biografado) também obtenha direitos sobre a comercialização do produto”, é o que prega, nos bastidores da Justiça e do Congresso Nacional (onde há um projeto de lei em tramitação sobre o tema), a associação Procure Saber.
Roberto Carlos, que em 2007 proibiu na justiça a venda do livro “Roberto Carlos em detalhes”, de autoria de Paulo César de Araújo, disse ontem no programa “Fantástico”, da TV Globo, que é a favor das biografias não autorizadas, desde que haja um entendimento preliminar entre o biógrafo e o biografado. "O biógrafo pesquisa uma história que está feita pelo biografado. Ele não cria uma história. Narra aquela história que não é dele, que é do biografado. Mas, a partir de quando escreve, ele passa a ser dono daquela história. Isso não é certo", reagiu o “Rei” em entrevista à apresentadora Renata Vasconcelos.
Chico Maranhão conta que percebeu um inútil e desconfortável sentimento nas manifestações de alguns integrantes do Procure Saber, “principalmente em Chico Buarque, casualmente ex-colega e amigo meu da FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de São Paulo)”. O cantor e compositor maranhense pisa mais fundo: “É preciso reduzir mais, tirar a roupa, ficar nu! Nós, artistas, podemos mostrar o nosso esqueleto sem nenhum problema”.
Papete revela-se decepcionado com seus ídolos, que em outros tempos defendiam a liberdade de expressão e lutavam contra todo tipo de censura. “Dá pra desconfiar se naquele época isso acontecia porque era oportuno e conveniente”. Rechaça o esconderijo oficial, os segredos guardados a sete chaves, “como se o seu infinito e leal séquito de admiradores não tivesse o direito de saber de suas vidas, seus aspectos, curiosidades, passagens pitorescas, sua forma de pensar”.
Leia abaixo o que dizem Chico Maranhão e Papete:Considerações ainda sobre a polêmica das biografias não autorizadasChico MaranhãoCantor, compositor e escritor
Tive notícia do assunto quarta feira, dia 16 deste mês, assistindo ao programa da TV Brasil 3a1 com Luiz Carlos Azevedo. Lá, três entrevistados discutiam a questão “Biografias” levantada por um grupo de artistas. Como achei um excelente programa, nem sempre comum na televisão brasileira, resolvi comentar com minha amiga jornalista Rô Caetano perguntando se ela tinha também visto. Ao me responder que não, questionou-me sobre qual meu posicionamento e logo percebi que há muito a polêmica já estava ocorrendo: um grupo de artistas, do meu tempo, isto é, da década de 1960 com quem eu convivi no período dos festivais, fustigava sobre o direito a suas privacidades. Hoje, pessoas famosas por suas obras, por seus feitos, suas ações, estavam, à minha vista, inquietas, preocupadas com a possível interpretação e divulgação de suas vidas íntimas, no que diz respeito a biografias sem autorizações dos biografados. E então, tentei colocar no ar meu ponto de vista, pois, numa primeira aproximação, percebi um inútil e desconfortável sentimento. Principalmente em Chico Buarque, casualmente ex-colega e amigo meu da FAU (Faculdade de Arquitetura). Escrevi um pequeno texto mostrando o quanto estava perplexo com os acontecimentos e enviei a Rô (sexta/18/10) que passou a alguns amigos. A polêmica cresceu como era de se esperar e hoje volto ao assunto.
Muita coisa foi dita e muita gente se manifestou, ampliou-se o quadro das discussões, reconhecimentos surgiram. Acho que houve evolução, sim, mas em que sentido? No alcance da humildade para se compreender melhor a questão? Sim, porque no início, e sempre no início, a radicalidade imperou e os pequenos e grandes poderes se manifestaram. Só se não fôssemos humanos, talvez, seria o contrário. E é aí que está o “espaço” não tocado, a condição humana, que, insisti no meu posicionamento, à resposta para minha amiga Rô Caetano. Tudo isto que os homens fazem, sentem, produzem... obras, ações, comportamentos, pensamentos, está aí para construir uma sociedade melhor. E nós artistas, especialmente, estamos aí para sermos instrumentos disto. E, assim, não há do que ter receio. Não há que ter medo! A construção de fatos que uma biografia cria depende dos fatos que nós fixamos com as palavras. E elas próprias, as palavras, têm interpretações diferentes, leituras diversas. E assim, necessariamente, desencadeiam uma miríade de conjecturas, de outras ideias, suposições, de outros fatos, outras realidades. Quem poderá dimensionar esta verdade? E por que então não aceitar este futuro passado? É preciso reduzir mais, tirar a roupa, ficar nu! Nós, artistas, podemos mostrar o nosso esqueleto sem nenhum problema. A sociedade brasileira, por acaso, não está neste caminho? Há ou não uma necessidade de se mostrar mais? Não é só coisa do privado, do público, sei lá mais o quê?! Não é isso, é mais e principalmente coisa da intuição. Da sensibilidade! Essas polêmicas, esses questionamentos, essas inquietações, a construção desses objetos, são imprescindíveis ao crescimento social. Por isso mesmo são louváveis. Portanto, amigos, acalmem-se, ainda precisamos muito das palavras, desta relação linguagem-mundo. E nem tudo estará nos textos, nas biografias, nas músicas, nas obras dos artistas, mas, obviamente, quem sabe?!, no conjunto de tudo isto.
"Quem não deve não teme"Papete Cantor, compositor e instrumentista
Sinceramente, pessoal, vamos combinar então: quem não deve não teme!!! Digo isso pelo fato de estar já ficando meio sem paciência com essas declarações e matérias referentes à questão das biografias, se pode ou não, se tem de autorizar ou não, se é certo ou não..., me decepciono com meus ídolos de outros tempos quando eles defendiam a liberdade de expressão e lutavam contra todo tipo de censura. Dá pra desconfiar se naquele época isso acontecia porque era oportuno e conveniente, mas o que pega mesmo é as pessoas ficarem escondidas sob segredos guardados a sete chaves como se o seu infinito e leal séquito de admiradores não tivesse o direito de saber de suas vidas, seus aspectos, curiosidades, passagens pitorescas, sua forma de pensar, e por aí vai.
O que me causa espanto é toda essa reação ao simples fato de que alguém pode ou não publicar aquilo que sabe sobre este ou aquele, e aqui quero fazer uma analogia ao tecer um comentário sobre pessoas tais como os reis da Suécia e da Noruega, que andam de bicicletas pelas ruas como pessoas comuns, exatamente por não terem nada a temer de seus súditos, que os admiram e respeitam, o que fatalmente aconteceria com essas pessoas que aqui no Brasil brigam pela não publicação de suas biografias - mais uma vez digo e repito: quem nada deve ou então sempre viveu uma vida digna, decente e honesta não tem de se preocupar com isso, afinal o que teriam a esconder da gente?