José Menezes Gomes (Professor do
Departamento de economia e do Programa Mestrado em Desenvolvimento
socioeconômico da UFMA)
O primeiro empréstimo externo contraído
pelo Estado maranhão, segundo consta nas Resoluções do Senado Federal que
autorizavam empréstimos externos, ocorreu em 1972, no governo Pedro Neiva de
Santana, no valor de US$ 54,464,832.54, com a finalidade de complementação do
programa rodoviário. Esse primeiro empréstimo ocorre um ano após o fim do
Acordo de Bretton Woods e a explicitação da crise do dólar e a respectiva expansão do Euromercado de
moedas. Em 1979, no governo João Castelo Ribeiro Gonçalves, tivemos o segundo
empréstimo no valor US$125,434,159.78 (sem informação sobre o emprestador, sem
a taxa de juros e sem prazo de amortização) destinados segundo essa fonte a
projetos prioritários do Estado. Em 1980, tivemos o terceiro empréstimo no
valor US$ 82,887,014.56 destinados à produção agropecuária. Nesse mesmo ano
ocorreu o quarto empréstimo com mais US$
55,258,009.71 (20 milhões) para a mesma destinação. Com isso, nesse ano
tivemos um total de US$ 50 milhões. Em 1981, ocorreu o quinto empréstimo no
valor de US$75,136,303.63 destinado a
finalidade rodoviária. Em 1983 ocorreu o sexto empréstimo de US$
34,286,596.39 para programa de
investimentos (na planilha não há descrição do tipo de investimento). Em 1984,
temos o sétimo empréstimo que atinge os US$ 109,558,710.30, para o
Plano de metas. Nesse mesmo ano aprova-se o oitavo empréstimo no valor de US$
241,029,162.66 para o Programa de investimentos (não há descrição dos
investimentos). Em 1985, surge o nono empréstimo no valor US$ 116,370,492.57
para Programa rodoviário do Estado (segunda destinação para esse item).
Em 1986, no governo Luiz Alves Coelho
Rocha, 14 anos após o início do processo de endividamento externo do Maranhão e
de já ter acumulado US$ 447,8 milhões ou quase meio bilhão de dólares de dívida externa, temos uma mudança de
finalidade dos empréstimos. Nesse ano temos o décimo empréstimo de US$
97,629,206.20 , seguido do décimo primeiro empréstimo de US$ 84,750,459.85 ,
totalizando US$ 87,8 milhões no mesmo ano. Agora os empréstimos destinam-se ao
refinanciamento dessa dívida externa. Em apenas 7 anos a dívida atingiu os US$
437,8 milhões em grande parte fruto da brutal elevação da taxa de juros
implementada pelos EUA, visando retomar a competitividade dos títulos da dívida
pública daquele país, quando chegou a 21% a.a. Como esses empréstimos foram
contraídos com taxa de juros flutuantes praticadas no Euromercado de moedas, a
elevação da taxa básica nos EUA elevou também a taxa LIBOR em Londres. Em
outras palavras, o estado do maranhão sofreu, também, grande impacto da
politica de combate a inflação e estabilização do dólar nos EUA e sua política
de juros altos e de endividamento interno. A grande potencia imperialista ao
buscar estabilizar sua economia provocou sequelas graves no Estado mais
subdesenvolvido da federação.
A partir de 1994 temos uma mudança na fonte
de financiamento. Se antes tínhamos emprestadores privados mediante garantias
do banco central, agora passamos a ter empréstimos vindos do Banco Mundial -
BIRD ou de entidade multilateral. É bom
lembrar que nas tomadas de empréstimos do maranhão com os agentes privados não
estavam definidas as taxas de juros, os prazo de amortização e os nomes dos
agentes emprestadores. O empréstimos de 1994 foi o décimo segundo, no valor US$
121,358,819.16 (79 milhões), com juros 0,5% acima do custo, com prazo de 10
anos para amortização destinados à Projetos de reabilitação e conservação de
rodovias. Em 1998, o Maranhão tomou o décimo terceiro empréstimo no valor de
US$ 111,736,441.72, novamente do BIRD, com taxa de 0,5% acima do custo, com
prazo de amortização de 15 anos, destinado ao combate combate a pobreza rural.
No final do anos 90 encerra-se o processo
de envidamento via cada Estado, passando a União a exclusividade nessa forma de
captação. De 1972 a 1988 o Maranhão tomou emprestado US$ 1.381.786.153,53. Durante
a maior parte desse processo os empréstimos foram feitos com taxas de juros
flutuantes, tendo em vista que a fonte destes empréstimos era o Euromercado de
moedas. Tal fato, teve grande impacto sobre as contas publicas desse Estado,
acelerando o caráter financeiro dessa dívida. A partir de 1986 o volume de
recursos vindos para o refinanciamento dessa dívida chegou a US$ 87,8 milhões.
Além da falta de transparência na tomada de
empréstimos e na alocação desses recursos constatamos que as destinações descritas
revelam que esses empréstimos foram feitos para dar sustentação aos grandes
projetos, deixando de lado os investimentos sociais. Curiosamente o último
grande empréstimo feito pelo Estado tem com destinação o combate a pobreza
rural. Isso indica que as politicas aqui implementadas impulsionaram o
empobrecimento da população rural e urbana, assegurando o enriquecimento
privado nesse Estado, enquanto explodiu o endividamento público.
O endividamento externo do Maranhão tem
relação direta com o retorno da crise capitalista logo após o fim dos trinta
gloriosos e crise fiscal e financeira do Estado capitalista, com a crise do
padrão ouro e a expansão de um sistema monetário internacional privado sediado
em Londres que expressava a expansão de uma pletora mundial de capitais (GOMES,
2004). Tratava-se de um gigantesco volume de capital inativo a procura de
tomadores governamentais ou com garantias governamentais. A formação dessa
pletora se devia a crescente fuga de capital da atividade produtiva motivada por
queda da taxa média de lucro, especialmente vinda dos EUA. O processo de
expansão do Euromercado de moedas pela América Latina foi bastante favorecido
pela existência de governos militares por quase todo o continente, que buscavam
se legitimar ao tentar imprimir um
perfil desenvolvimentista.
Esse processo de endividamento externo,
depois convertido em dívida pública federal a partir de 1997, colocou o Estado
maranhão na rota da mundialização das finanças tendo os banqueiros e fundos de
Pensão, nacionais e internacionais, os grandes beneficiários da transferência
de recursos vindos da produção diretamente para a esfera financeira. Outra
consequencia desse processo foi a amplificação da crise fiscal e financeira do
Estado do maranhão com o comprometimento de crescente parcela da receita que
acabou por dificultar até mesmo a capacidade de financiamento desse Estado.
O endividamento externo dos estados e
municípios vai estreitar os laços políticos entre as oligarquias regionais,
apoiadoras do regime militar com a oligarquia financeira internacional sediada
em Londres. Ao mesmo tempo que prepara as bases para os grandes projetos,
especialmente para os grandes grupos estrangeiros, também foi impulsionada uma
verdeira entrega de terras públicas para grandes grupos nacionais e
estrangeiros a partir de incentivos fiscais, que acabou por expulsar um volume
crescente de trabalhadores rurais. Vale destacar que nesse momento não tratamos
do processo de endividamento público interno feito pelo Estado do maranhão,
especialmente via o Banco do Estado do Maranhão - BEM.
Para
Gomes (2004) o impacto da “reaganomia” no Brasil, pode ser
vizualizado no quadro abaixo descreve como a dívida efetivamente evoluiu e faz
simulação sobre sua trajetória caso a taxa de juros tivesse se mantido em 6%,
que vigorava antes. Nessa simulação, o que foi enviado para os credores desde
então seria capaz de pagar toda a dívida em 1989, mesmo computando os
empréstimos recebidos após 1978, o que levaria o país à condição de credor[1]. Segundo este quadro, de 1978 a 2002 os pagamentos
de juros e amortizações da dívida externa atingiram US$ 684 bilhões (soma maior
que o valor de US$ 527 bilhões recebido em empréstimos). Tal fato não impediu
que a dívida saltasse de US$ 52,8 bilhões, em 1978, para US$ 229 bilhões, em
2002. Com isso o país pagou US$ 157 bilhões a mais do que recebeu, significando
transferência líquida de recursos para o exterior, e ainda assim a dívida se
multiplicou por quase cinco. Segundo Mandel (1990, p. 284), o fato de a dívida
ser lavrada em dólares permitiu que todos os tomadores de empréstimos ficassem
sujeitos à política monetária dos Estados
Unidos. Por esse motivo, a política de Reagan implicou a explosão das
dívidas dos países subdesenvolvidos e o aumento das
transferências de recursos para os países centrais. Segundo dados do Banco
Central, as dívidas da União, dos estados, dos municípios e das empresas
estatais, somadas, representavam 62% do PIB em agosto de 2002, motivadas em
parte pela valorização de 20,54% do dólar .
Torna-se se fundamental importância a luta por uma auditoria da
divida externa do maranhão, tendo em vista que nessa primeira análise do
relatório do senado federal, referente a dívida externa do maranhão não sabemos
quais as taxas contratadas, os prazos de amortização e especialmente quais os
emprestadores, e quais suas reais destinações. É fundamental conhecermos a
natureza desse endividamento externo porque poderá explicar parte do
endividamento público atual e suas ligações com os problemas sociais nesse Estado. Portanto,
antes de se buscar uma nova dívida temos fazer uma auditoria da dívida externa
do Maranhão.
[1] SENADO FEDERAL (1987) Relatório da Comissão Especial do Senado
Federal para a Dívida Externa – 1987/1988. Relator: Fernando Henrique
Cardoso. Biblioteca do Senado, 336.34.B823 RDE
[1] Extraído do Boletim da Coordenação da “Auditoria Cidadã
da Dívida” – n. 6 – 17 de abril de 2003[por
favor, inclua como entrada da lista de referências, completando com os dados
faltantes]. O Grupo da Auditoria Cidadã da Dívida concluiu a análise dos
28 contratos de endividamento externo brasileiro disponibilizados pelo Senado
Federal, referentes ao período de 1964 a 1972, e elaborou publicação com base
naqueles, divulgada no FSM 2003 e disponível na internet, na página www.unafiscobh.com.br
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